Manoel Fernandes Neto Nunca imaginei que lápides de bronze em campas vitrificadas fossem tão caras. Sou obrigado a me contentar com a caiação branca, daquelas que grudam na roupa em Finados. Enfim, regateio a melhor maneira de deixar minha derradeira mensagem, minha morada definitiva. Amanhã, estarei morto. Devo comprar fiado. Só assim deixo de pagar conta em dia, única preocupação nos últimos anos, em que acordei às seis, li meu matutino até às nove e na hora em que o banco abria, lá estava eu. Primeiríssimo da Silva. De alguma maneira gostava daquilo. Dizer o primeiro bom-dia ao caixa, contar as principais novidades da cidade. Vez por outra, ser convidado…
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Cartas à Manu: fragmentos de uma distância
Querida Manu. Pensamentos fragmentados. Rotinas incessantes. Um pouco de tudo, Manu. Fundo e raso. O céu e o charco. Erros e acertos e eu sempre a adiar te escrever. A exigência em demasia, inimiga da produção. Um caleidoscópio. Muitos recomeços, nada nunca bom. Acabei unindo tudo em uma única carta, a oitava, acho. Espero que te encontre bem, com Brunão e sua turminha de Dublin. Aqui, eu, Rafa e Cris cada vez mais unidos, com mais amor. Os meses passam, a luas se multiplicam, mudamos e renovamos. Lá vai um pouco de algo de cada coisa: Rotina A ética hacker foi pouco a pouco abandonada, ou melhor, colocada de lado.…
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Cartas à Manu: Um dia para celebrar a Unidade
Querida Manu Seu aniversário sempre foi especial. Sempre teve contagem regressiva, anunciação. E você merece todas as homenagens: que mulher tremenda que você se tornou! Já contei grande parte de sua história no Calhamaço de Viagem. Mas sempre tem algo a mais pra falar, não é mesmo? Hoje, acima de tudo, quero agradecer a você por ter me tornado um cara melhor a partir do momento que caminhei pelos corredores do hospital Santa Catarina, naquela manhã de abril; em que fiz aquele poeminha para você; em que me descobri imortal. Gratidão: não tem palavra mais verdadeira do que essa. Ser pai, de você e da sua irmã Rafa, renovou como…
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Precisamos conversar sobre exílios
Manu amada, A realidade se impõe. Explico: quando me propus a escrever para você, era baseado na franqueza da nossa relação e tudo que eu poderia dizer a ti neste período de distância. Minhas visões: da vida, do Planeta, do nosso país. Algo como um seriado do piloto Calhamaço. Para ser lido agora e no futuro, embalados na saudade e o que vivemos nesses tempos; felizes, sim, esperançosos, mas não falseados pela história, essa diva. Por isso precisamos conversar sobre exílios. Exílios germinam dentro da gente, a esperar o momento de se manifestar. Pode ser a partida derradeira e necessária de Jeans, Andersons, Márcias, Déboras, que deixam o país por…
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Cartas à Manu: Definitivo mesmo são suas experiências de amor e tolerância.
Querida Manu, Imagina minha felicidade por você ter descoberto um centro espírita em Dublin – o Spiritist Society of Ireland – e em um frio domingo pela manhã ter assistido junto com o Brunão uma doutrina pública. Lembro bem de uma época nossa, que contei de forma completa no Calhamaço de Viagem, quando aceitei como filosofia de vida a imortalidade do espírito, a reencarnação e tantos outros pilares da doutrina codificada por Allan Kardec. Naqueles dias, você com 10 anos, pegávamos o ônibus duas vezes por semana para assistirmos palestras no centro espírita que nos identificamos aqui em Blumenau. Noites de muita felicidade. Sempre gostei de palestras nos domingos de…
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Fevereiro, 2019, 28 dias
Amada Manu 21 horas do dia 27 de fevereiro. A pensar nos últimos dias do mês que não escrevi para você. E escrever para você me faz uma pessoa melhor. De certa forma, ao conceber essas cartas falo também para sua irmã e para o futuro. Cartas assim com destinatários tão sublimes devem sim se repetir com mais frequência, algo que não fui capaz de fazer nesse mês de fevereiro, tão curto, tão fluido. O fato é que não controlamos o que sentimos e pensamos em cada dia. Alguns são nobres, e a consciência se desprende com facilidade. Outros, pesados, que nos deixam pregados no chão, raízes a se aprofundar…
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Cartas à Manu: Sobre paredes e metáforas
Querida Manu, Todos nós estamos muito felizes com suas novas experiências em terras distantes. Seu avanço nos estudos, suas vivências profissionais, sua vida com novos amigos e amigas com quem instalou, recentemente, seu novo canto: uma casa encantadora em uma rua histórica de Dublin. Lá, estão sua estação de trabalho e o espaço para filmagens de seus vídeos. Aqui, caminhamos mantendo o otimismo inabalável; o pensamento que cultiva a abundância de uma vida plena: materialmente, espiritualmente, socialmente. A viver cada vez com mais desprendimento, menos julgamentos a si mesmo e ao outro. Você sabe, dessa forma nossos passos são firmes na jornada. Atrasei um pouco minha agenda de duas cartas…
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Cartas à Manu: Resistência, broas e silêncios
Amada Manu Em cada linha que escrevo, pode parecer que a todo momento falo de saudade. Aquela saudade que se revelou adiantada naquele capítulo do Calhamaço de Viagem; saudade controlada pela felicidade de te ver feliz. Longe ou perto, o amor é algo surpreendente. Liberto de amarras, nos oferece doces frutos. O outro feliz é força descomunal para seguirmos em frente; o outro feliz é energia duradoura. A distância é simbólica, quase inexistente quando caminhamos juntos. Vejo agora, com direito a fotos, você pelas ruas de Dublin. Novos amigos. Novas paisagens, sentimentos renovados. Você no mapa do WhatsApp em tempo real. Você na busca de ser feliz. Hoje, você me…
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Cartas à Manu: Carona Civilizatória
Querida Manu, São tempos quentes aqui no Brasil. A temperatura de quase verão passa de 35 graus em várias regiões. Em Blumenau, nem se fala. Bem diferente do que você vive em Dublin, com termômetros perto de zero. Mas o quente é também a reação da maioria da sociedade civil e mídia esclarecidas com a proximidade da posse do novo governo conservador, para ficar em um eufemismo. Momento em que as conquistas civilizatórias de décadas serão abandonadas pelas políticas públicas. Mais ainda: seguidores ingênuos que antes do tsunami do atraso não compreendiam que o progresso é inexorável, hoje se auto intitulam senhores da pós-verdade, que a todos nos salvarão. Um…
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Novo livro do Rovai
Chegou minha leitura de verão, o novo livro de Renato Rovai, grande amigo de quase duas décadas na seara do jornalismo digital. Primeira impressão: um trabalho de fôlego, que merece uma leitura com um lápis na mão. Memória ainda viva do que vivemos nesse tempo de luta, muita luta; mas também muito aprendizado. Valeu, Rovai!