Cartas à Manu

Cartas à Manu: fragmentos de uma distância

Você e Brunão: caminhada e descobertas.

Querida Manu.

Pensamentos fragmentados. Rotinas incessantes. Um pouco de tudo, Manu. Fundo e raso. O céu e o charco. Erros e acertos e eu sempre a adiar te escrever. A exigência em demasia, inimiga da produção. Um caleidoscópio. Muitos recomeços, nada nunca bom. Acabei unindo tudo em uma única carta, a oitava, acho. Espero que te encontre bem, com Brunão e sua turminha de Dublin. Aqui, eu, Rafa e Cris cada vez mais unidos, com mais amor. Os meses passam, a luas se multiplicam, mudamos e renovamos.

Lá vai um pouco de algo de cada coisa:

Rotina

A ética hacker foi pouco a pouco abandonada, ou melhor, colocada de lado. Ficou um tantinho ali ou acolá, acho que você percebeu com os anos. Mas aquela sensação de que todos dias é um fim de semana já não existe. A própria paralisação da revista NovaE me afastou muito da revolução não televisionada com a qual sonhamos, principalmente de amigos e amigas. Falo disso no Calhamaço. Não fica tão cristalino, por isso é sempre bom voltar ao assunto. Entrar no jogo do mercado – vender, inovar, formatar, comprar, atender – pode sim ser uma boa para quem considera um jogo bruto demais lutar pelas suas convicções ou pelos seus reumatismos. Continuo com dignidade mesmo não tendo você a me acompanhar pelas manhãs. Fisicamente, claro, porque somos hoje mais ligados do que antes. Tenho uma “Trello” certeza.

Humanidade

Nossa porção de humanidade tem a capacidade de renovação constante. Mesmo com o entorno com aquela força sempre premente de nos imputar desânimo em manter a misericórdia. De todos os lados a ira, a tosquice, a falta de elegância na elaboração de um pensamento. O isolamento é real. Mas a fé de que tudo será ainda reinventado; de que tudo tem um propósito racional. O pêndulo da história ainda está em ação. Isso é o que importa.

Novos textos

Foram muitas as promessas de novos textos que fiz no Calhamaço. Contos, crônicas, um novo livro, artigos. Ainda há tempo. Mas me seguro nessas cartas, que são criadas com muita dificuldade, mas não menos amorosas. Escrevo sim muito: conteúdos muito competentes sobre várias área de atuação da economia, campanhas publicitárias, roteiros, posts profissionais. Faz falta sim quantidade igual de algo com mais liberdade de ação; algo que diga mais sobre mim e todos nós aos leitores do futuro. Texto são mensagens na garrafa em tempos de nuvem de informação. Pelo menos enquanto houver essa possibilidade.

Periodicidade

Vi que a última carta data do seu aniversário, 29 de abril, mais de dois meses. O tempo regular é algo estranho. Sempre pensamos que estamos na frente. O tempo voa é uma falsa metáfora. Hoje, ele é um flash, melhor dizer. O tempo não para, dizia o poeta e eu dou boas-vindas a novas dores, novos desânimos, novos dificuldades que me fazem adiar boas iniciativas, como caminhar, filosofar e escrever a ti. Minha periodicidade é secular. “Compositor de destinos, tambor de todos os ritmos”, como na canção de Caetano.

Um período fragmentado, mas não menos incessante.

Espiritualidade

Ver e sentir o mundo espiritual me ajuda muito na caminhada. Mas isso não impede as quedas frequentes. São muitas; altos e baixos que tento controlar. Da melhor maneira, impossível! Vai do jeito que der. Sensações. Um cálice de vinho, boas leituras e longas noites de sono. Sem temer o ontem, sem esperar o amanhã. Estar aqui, presente.

Saudade

Ainda sinto e muito. Nos primeiros meses, entrei em um turbilhão, como se trabalhar sem controle fosse me libertar de sua falta. Deu um tilt mental e tive que recuar na tática. Depois, alguns dias e algumas noites para voltar ao centro. Atualmente, ainda me pego emotivo; mas já controlo. Apesar de que o controle nem sempre é bom; me mantém vivo e animado ver você com tantas conquistas, mas também desafios; me mantém animado lembrar de ti; me mantém animado como já disse coisas desde que você embarcou. Vamos em frente, maruja. O barco da vida navega sem temor.

Amo você.

Abraços à família dublinense

One Comment

  • Rosa Alegria

    Chorei Maneco, por sentir seu sentir (Diego está vivendo na Inglaterra), por voltar aos velhos tempos de textos entrelaçados a quatro mãos e duas mentes, por sentir sua grandeza em palavras que fazem jorrar as saudades em cascatas. Bravo!

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