Cartas à Manu: Carona Civilizatória

Querida Manu,

São tempos quentes aqui no Brasil. A temperatura de quase verão passa de 35 graus em várias regiões. Em Blumenau, nem se fala. Bem diferente do que você vive em Dublin, com termômetros perto de zero. Mas o quente é também a reação da maioria da sociedade civil e mídia esclarecidas com a proximidade da posse do novo governo conservador, para ficar em um eufemismo. Momento em que as conquistas civilizatórias de décadas serão abandonadas pelas políticas públicas. Mais ainda: seguidores ingênuos que antes do tsunami do atraso não compreendiam que o progresso é inexorável, hoje se auto intitulam senhores da pós-verdade, que a todos nos salvarão. Um fake com repercussão planetária.

Mas, como em todos os processos, a resistência se mantém e a semana que passou foi algo bem marcante nesse palco.

Os Cúmplices no embate entre o saber e estupidez: James Beck, Fábio Hostert, Sabrina Marthendal, Sabrina Moura e Pépe Sedrez

Criei a #rafaelaatrizcarona e cada vez que a usava nas redes me emocionava. Pudera, dia 13 de dezembro foi uma noite especial. Você assistiu ao vivo com a transmissão da Mi Alves, nossa amiga de todas as horas. Após seis anos em que anualmente eu corria para pegar a primeira fila para ver você, dessa vez era por ela: nossa pequena Rafaela tornava-se atriz e fazia sua estreia em um espetáculo belíssimo em texto e cenografia: MãoComMão.

A Carona da hashtag vem do nome da escola e grupo teatral: Cia. Carona de Teatro. A Carona que sempre nos emociona com sua capacidade de nos manter vivos. São mais de vinte anos que o grupo forma atrizes e atores, amadores e profissionais. A 21a Mostra Carona de Teatro trouxe uma semana de liberdade. A força da arte que forma acima de tudo cidadãos e cidadãs. Pessoas do mundo. Pessoas sem ódio, sem preconceitos, sem dogmas. Uma escola que abre a porta do Planeta para seus alunos e faz brotar o que somos em nossa essência: Luz.

E como a Rafa brilhou, Manu, junto com outras e atrizes e atores em uma peça profunda. Falou do medo. Falou de um mundo em ebulição. Falou do que a gente compreende e do que não compreende. Um texto que brincou com a linguagem, em que às vezes a voz era dos personagens, mas às vezes era dos próprios atores mirins, garantido sua presença no espaço e tempo.

Rafaela: que sabe como ninguém o mundo que quer viver. O futuro que busca usufruir.

E a Rafa atriz Carona ali, no meio disso tudo, compreendendo cada contexto, cada palavra, cada raciocínio. Como ela faz em casa, no exercício de discernimento constante, em que consegue diferenciar, como poucos adultos hoje, o que é um avanço do que é um retrocesso. Rafa, que sabe como ninguém o mundo que quer viver. O futuro que busca usufruir.

E a Cia Carona de Teatro teve muito mesmo a ver com isso: conviver com o novo, com o original; inventar soluções criativas para o processo de redescobrimento de cada um quando toma contato com arte profunda; arte que traduz o belo. E o belo não deve ter oposição, o belo não deve ter contraponto. A mente nos liberta, o amor nos liberta, a amizade e a união nos libertam. Você viveu isso com a Carona, e agora ela refaz a mesma trajetória. Eu ali na plateia, puro êxtase, com os olhos molhados, ao meio de uma epifania do que realmente é uma resistência, do que realmente pode mudar o mundo e evitar a tragédia.

Quero sim uma carona para o futuro, quero sim uma carona em corações que afagam e educam, quero sim uma carona junto daqueles que são desprovidos de covardia de lutar, que inspiram, apesar de dificuldades que sabemos que existem nessas iniciativas. E aqui vale o nome de todos, sem abstrações. São esses os responsáveis, nossos cúmplices nesse eterno embate entre o saber e estupidez: James Beck, Sabrina Moura, Sabrina Marthendal, Fábio Hostert, Pépe Sedrez.

Fique bem, lembranças aos dublinenses. Diga a todos: “Eles resistirão!”

Para saber mais: https://ciacarona.com.br

PS: Manu, Manu, essas cartas estão a me fazer bem. Estão a me fazer vibrar. Estão a me iluminar.

Por Manoel Fernandes Neto

 

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